Explorando a advocacia moderna: Criatividade e mente estratégica

Quando se fala em serviços advocatícios uma das primeiras características que nos vem à mente é o conservadorismo e a formalidade excessiva. Por outro lado, não é segredo que a era da informação, onde tudo muda e se desenvolve rapidamente, exige-nos, na mesma velocidade e constantes adaptações. Por isso, vamos falar um pouco mais sobre as perspectivas e caminhos da advocacia moderna.

Um olhar para o futuro

 

Até certo tempo, os escritórios de advocacia e seus advogados eram procurados por um propósito: advogar. Hoje, o mero conhecimento técnico e minucioso da lei não são diferenciais, são pressupostos. A mera resolução de litígios e a simples reação aos problemas do cliente não bastam, não são suficientes. É preciso ir além. É preciso agilidade e eficiência; é preciso antecipar-se. No mundo de hoje, para proporcionar serviço jurídico de qualidade, a advocacia precisa se redesenhar, reinventar-se, interna e externamente, o que não é possível sem a criatividade e mente estratégica, os grandes pilares da advocacia moderna.

 

Como enxergar e proporcionar isso na prática? Primeiro, a forma de se prestar o serviço jurídico deve ser revisitada.

 

Exemplo: revendo os serviços para a advocacia moderna

 

Em regra, cada profissão (e, em uma escala mais profunda, cada indivíduo) possui um método particular de processar informações. Algumas são mais analíticas e organizadas; outras, mais experimentais e relacionais; a advocacia, por muito tempo, conservadora, burocrática e (é claro) legalista. Mas o profissional moderno, em especial o advogado, requererá todas essas diferentes abordagens em diferentes fases para proporcionar a melhor estratégia, a melhor solução. Citamos um exemplo.

 

Imaginemos uma empresa multinacional com uma filial no Brasil e sede na Inglaterra. Por ser uma indústria de grande porte e estar localizada em um país cuja legislação trabalhista é bastante rigorosa, a unidade brasileira apresenta um quadro de mais de 500 reclamações trabalhistas.

 

No Brasil, a empresa contrata um escritório e informa que a prioridade, para todos os casos, é o acordo. Ao analisar as demandas, a equipe do escritório de advocacia entendeu que 80% dessas ações trabalhistas poderiam ser revertidas, parcial ou integralmente, se discutidas até o tribunal, e fica surpresa com a informação de que a prioridade, como solicitado pelo cliente, era o fechamento de acordos, e não a continuidade do processo.

 

Em uma reunião de alinhamento de estratégias, o advogado, formalista, comunica que não há razões para fechar acordos. Afinal, 80% dos casos, se discutidos até o tribunal, poderão ser favoráveis à empresa! Eis que o cliente informa que, na sua contabilidade, todo o valor discutido fica provisionado na sede, na Inglaterra, e não é repassado à unidade do Brasil até que o assunto esteja resolvido. Por precisar urgentemente do aumento do seu fluxo de caixa, a empresa precisa encerrar as demandas o quanto antes, ainda que perca parte do valor. Realmente, o litígio nem sempre é a melhor solução, e, nesse caso, o escritório deverá ser hábil (e criativo!) para conseguir fechar o maior número de acordos possível.

 

Segundo Ned Hermann, autor da “Teoria da Dominância Cerebral”, “Nas empresas do futuro, os novos líderes não serão mestres, mas maestros. A tarefa de liderar será antecipar os sinais das mudanças que estão porvir, inspirar a criatividade e obter a melhor ideia de todos”. Este último aspecto nos interessa em especial, pois é nele que reside a fórmula para se antecipar às tendências do futuro, viabilizando o pensamento jurídico estratégico e, por consequência, criando o advogado que, mais do que resolver problemas, evita-os.

 

Uma nova era para profissionais e escritórios

 

Os profissionais da advocacia moderna precisam conhecer quais são suas habilidades criativas e seus métodos de pensar mais efetivos. Cada profissional consegue abordar um problema de forma diferente dos outros, e por sua vez, encontrar soluções diferentes. Ainda, quando um indivíduo convive com diferentes formas e abordagens de processamento de informações e pensa de forma multidisciplinar, aumenta-se a possibilidade de se desenvolver estratégias mais lucrativas para o cliente e para o negócio do próprio profissional.

 

Além disso, a nova advocacia não pode fechar os olhos às necessidades internas, do seu corpo de profissionais, que, na atualidade, exige o abandono do formalismo excessivo e do conservadorismo desnecessário. Naturalmente, o mercado jurídico é formal por natureza, mas equilíbrio entre seus valores e as exigências do mundo moderno é regra para sobreviver no mercado e nos anos que estão porvir.

 

A gestão horizontal do negócio, por exemplo, é um mecanismo adotado por empresas e escritórios que proporciona desenvolvimento criativo na solução de dificuldades gerenciais e técnicas. Nela, um maior número de profissionais participa da tomada de decisão do escritório ou da empresa, o que possibilita uma visão ampla e diversa dos problemas e desafios a serem enfrentados. O resultado quebra paradigmas, fornece soluções rápidas e criativas às dificuldades e permite uma visão multidisciplinar do negócio do cliente (e do próprio!) e das futuras tendências. Uma equipe engajada estará mais sujeita a fornecer soluções criativas.

 

Um notável exemplo da gestão horizontalizada reside na criação de comitês e comissões multidisciplinares, com temas relacionados à área de gestão institucional do negócio. Nelas, por meio da pluralidade de ideias, as equipes antecipam problemas, promovem soluções, anteveem tendências futuras; criam cenários alternativos; entendem opções; determinam objetivos; traçam a direção a ser tomada para alcançar seus objetivos.

 

Novas tecnologias também impactam diretamente a qualidade do serviço jurídico prestado e criam um espaço fértil para a criatividade. Sistemas de gestão processual avançados, automação, inteligência artificial, jurimetria e outras ferramentas, todas desenvolvidas para erradicar trabalhos mecânicos e repetitivos, que consomem tempo e não trazem resultado, permitem que os profissionais concentrem seu esforço intelectual na produção de um trabalho mais técnico, preciso – criativo e estratégico.

 

Neste ponto, o pensar estratégico e criativo do advogado ganha corpo ao colocar as novas tecnologias a serviço de uma advocacia mais técnica, não somente no sentido literal e romântico da militância advocatícia em si, mas sim numa acepção muito mais ampla que vai além da órbita do departamento jurídico, que pode alçá-lo à condição de um parceiro estratégico para o negócio do seu cliente.

 

Voltemos ao exemplo da empresa que possui 500 reclamações trabalhistas acima. Em que pese a solicitação do cliente para que fossem efetuados acordos em todas as demandas, o advogado moderno, usando a tecnologia como sua fiel aliada, consegue sugerir ao seu cliente uma escala de prioridades para a realização de tais acordos, de acordo com o entendimento predominante de cada vara judicial em que os processos tramitam, ou ainda melhor, propor, de maneira fundamentada numa análise preditiva (jurimetria), que o provisionamento de parte dos processos está em desacordo com o risco da demanda, se analisado conforme posicionamento dominante de cada vara ou juiz e, por conseguinte, sugerir que os valores provisionados sejam readequados para outros patamares.

 

Como já amplamente assentado nos diversos canais de comunicação e entidades que estudam e acompanham a evolução tecnológica da advocacia, a tecnologia não veio substituir o advogado, mas sim dar-lhe condições de olhar além do direito e de tornar-se um parceiro estratégico de negócios do seu cliente. É o casamento perfeito!

 

A advocacia moderna exigirá profissionais com formações mais ecléticas – como gerenciamento de pessoas, gerenciamento de equipes, gestão de empresas, marketing pessoal e institucional. Pilhas de papel são sinônimo de atraso, não de trabalho. Os escritórios que desejarem sobreviver nesse mercado jurídico avassalador (o Brasil possui mais de 1.200 cursos de Direito!) terão que se adaptar – e prever – as novas tendências, utilizando-se do planejamento estratégico, criatividade e tecnologia para traçar planos que vão além das necessidades e dos problemas do hoje, planos que realizem o futuro do cliente.

 

Caio Barros Ferraz de Oliveira (Sócio do LJD, formado em direito, pós graduado em Gestão Ambiental e Pós graduando em Direito Tributário – FGV Law).

Caio Bossi de Araújo (Estagiário. Co-autor).