A adoção de tecnologias de gestão, inteligência artificial e sistemas de monitoramento digital vem alterando de forma significativa o perfil das demandas trabalhistas no país. Esses recursos, que inicialmente surgiram para aumentar eficiência e padronizar processos, passaram a ser analisados pela Justiça do Trabalho, pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pelos sindicatos sob uma perspectiva de risco e responsabilidade empresarial.
Nos últimos anos, observou-se um aumento expressivo de reclamações trabalhistas envolvendo alegações de pressão por metas automatizadas, monitoramento excessivo, violações de privacidade e impactos na saúde mental. Esse novo repertório de argumentos demonstra como a digitalização do ambiente de trabalho tem ampliado a complexidade das disputas judiciais.
O MPT, por sua vez, intensificou investigações sobre o uso de ferramentas tecnológicas capazes de influenciar a organização do trabalho. Procedimentos investigatórios têm analisado telemetria, geolocalização, softwares de captura de tela, métricas de produtividade e sistemas que avaliam desempenho de forma automática. O foco é verificar se há proporcionalidade, transparência e preservação dos direitos fundamentais dos trabalhadores.
Os sindicatos também ampliaram seu campo de atuação. Além das pautas tradicionais, passaram a questionar metas definidas por algoritmos, limites de monitoramento e impactos na saúde mental decorrentes de processos excessivamente automatizados. A negociação coletiva tornou-se um espaço relevante para discutir governança tecnológica e impactos sociais da digitalização.
Nas ações trabalhistas individuais, a tecnologia tem introduzido novos elementos probatórios. Registros de login e logout, histórico de acessos, indicadores de produtividade e dados de monitoramento remoto podem ser utilizados tanto pela empresa quanto pelo empregado, gerando controvérsias sobre jornada, controle de atividades e condutas consideradas abusivas.
Tem crescido, ainda, o número de demandas relacionadas a “assédio organizacional algorítmico”, discriminação em processos avaliativos mediados por IA e alegações de adoecimento mental associado ao uso de plataformas de trabalho. A análise desses casos exige das empresas clareza sobre o funcionamento das ferramentas adotadas e documentação técnica capaz de demonstrar critérios objetivos.
Nesse contexto, a atuação preventiva torna-se indispensável. Governança tecnológica, políticas internas atualizadas, avaliação de risco jurídico, treinamento de lideranças e revisão periódica de sistemas são medidas essenciais para reduzir vulnerabilidades. Empresas que utilizam tecnologia sem critérios claros tendem a enfrentar mais processos e investigações.
Outro ponto crítico é a necessidade de transparência. O empregado deve compreender quais dados são coletados, para qual finalidade e quais ferramentas influenciam sua avaliação e rotina de trabalho. Essa clareza fortalece a confiança e reduz a probabilidade de litígios.
Por fim, a integração entre Jurídico, RH, TI e Compliance tornou-se fundamental. A digitalização trouxe novas oportunidades, mas também impôs um novo paradigma de responsabilidade: decisões automatizadas e sistemas digitais precisam ser previstos, controlados e justificados. Empresas que se antecipam a essas discussões constroem ambientes mais equilibrados, reduzem contingências e fortalecem sua segurança jurídica.